2021-01-13
Susana Vieira

Quase um ano após o início da crise sanitária provocada pela Covid-19 em Portugal, as medidas de mitigação e contenção tiveram um forte impacto na economia e, naturalmente, no setor imobiliário. As regras inicialmente postas em prática para os contratos de arrendamento são agora prorrogadas para meados de 2021 e acompanhadas de novas medidas de apoio.

1. Arrendamento habitacional

O pagamento das rendas devidas até ao dia 1 de julho de 2021 pode ser adiado pelos inquilinos cujos agregados familiares sofreram uma redução significativa do rendimento (determinada de acordo com as regras da Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril na redação atual dada pela Lei n.º 75-A/2020, de 30 de dezembro).

Em alternativa, os inquilinos podem apresentar uma candidatura ao Instituto Português de Habitação e Urbanismo e Reabilitação Urbana (IHRU) para a obtenção de um empréstimo sem juros para cobrir o pagamento de rendas vencidas durante o período acima mencionado até uma taxa de esforço máxima de 35%.

Para o efeito, os inquilinos devem informar por escrito o senhorio que desejam fazer uso destas regras pelo menos 5 dias antes do vencimento da renda em que pretendem beneficiar deste apoio, juntando a documentação comprovativa da situação de carência económica.

Os senhorios que sofrerem uma redução significativa dos rendimentos resultante da suspensão do pagamento de rendas por arrendatários, podem também solicitar um empréstimo sem juros junto do IRHU por forma a compensar o valor da renda mensal devida e não paga.

Os beneficiários do apoio financeiro com base na quebra de rendimentos devem remeter, trimestralmente, informação atualizada que comprove a respetiva quebra.

2. Arrendamento não habitacional

Os inquilinos com empresas em situação de encerramento ou restrições de actividade devido às medidas de mitigação e contenção da Covid-19 podem diferir o pagamento das rendas vincendas até 1 de julho de 2021.

Adicionalmente, é criado um novo regime especial aplicável aos arrendatários cujos estabelecimentos tenham sido encerrados desde, pelo menos, março de 2020 e que a 1 de janeiro de 2021 ainda permaneçam encerrados. A duração do respetivo contrato é prorrogada por período igual ao da duração da medida de encerramento, contando-se a prorrogação desde o termo original do contrato.

Relativamente às rendas vencidas em 2020, e cujo pagamento tenha sido diferido, o arrendatário pode voltar a diferir o respetivo pagamento. O período de regularização da dívida terá início a 1 de janeiro de 2022 e prolonga-se até 31 de dezembro de 2023, sendo efetuado em 24 prestações sucessivas, de valor correspondente ao resultante do rateio do montante total em dívida por 24, liquidadas juntamente com a renda do mês em causa ou até ao oitavo dia do calendário de cada mês, no caso de renda não mensal.

O arrendatário que pretenda beneficiar deste regime deve comunicá-lo ao senhorio, por escrito mediante carta registada com aviso de receção, enviada para a respetiva morada constante do contrato de arrendamento ou da sua comunicação imediatamente anterior, até 20 de janeiro de 2021, retroagindo os seus efeitos a 1 de janeiro de 2021, se a comunicação tiver sido posterior a esta data.

Caso o arrendatário exerça este direito, os senhorios podem requerer a concessão de um empréstimo, mediante uma linha de crédito com custos reduzidos, por referência às rendas do ano de 2020 e de 2021, vencidas e não liquidadas.

Prevê-se igualmente a existência de apoios a fundo perdido:

  • Os arrendatários que, no ano de 2020, sofreram uma quebra de faturação entre 25% e 40%, recebem um apoio a fundo perdido de valor equivalente a 30 % do valor da renda, com o limite de €1.200 por mês;
  • Os arrendatários que, no ano de 2020, sofreram uma quebra de faturação superior a 40%, recebem um apoio a fundo perdido de valor equivalente a 50 % do valor da renda, com o limite de €2.000 por mês.

2.1. Centros comerciais

De acordo com o artigo 168.º-A da Lei n.º 2/2020, de 31 de março, na redação dada pela Lei n.º 27-A/2020, de 24 de Julho, não eram devidos quaisquer valores a título de rendas mínimas, até 31 de dezembro de 2020, sendo apenas devido o pagamento da componente variável da renda, calculada sobre as vendas realizadas pelo lojista, e das despesas contratualmente acordadas.

Em novembro de 2020, a Provedoria de Justiça requereu ao Tribunal Constitucional a fiscalização abstrata da constitucionalidade desta norma, aguardando-se que o respetivo acórdão seja proferido em 2021.

Por outro lado, a data de início da sua aplicação suscitou algumas dúvidas, pelo que, em dezembro de 2020, o Parlamento aprovou na generalidade uma norma interpretativa com o objetivo de clarificar que esta norma deverá aplicar-se ao período compreendido entre 13 de março (início da crise sanitária) e 31 de dezembro de 2020 e a todos os “tipos” de conjuntos comerciais, designadamente retail parks e outlets. À data da presente publicação, aguarda-se a aprovação do texto final da norma e a publicação desta norma interpretativa em Diário da República, a qual terá seguramente impacto ainda durante 2021.

A Lei do Orçamento de Estado para 2021 veio, adicionalmente, prever para o primeiro trimestre de 2021 e com possibilidade de prorrogação até 30 de junho de 2021, que a remuneração mensal fixa ou mínima devida pelos lojistas de estabelecimentos abertos ao público inseridos em centros comerciais é reduzida proporcionalmente à redução da faturação mensal, até ao limite de 50% da montante da remuneração mensal, quando tais estabelecimentos apresentem uma quebra do volume de vendas mensal nos seguintes termos:

  • face ao volume de vendas do mês homólogo do ano de 2019;
  • ou, na sua falta, ao volume médio de vendas dos últimos seis meses antecedentes à primeira declaração do Estado de Emergência, ou de período inferior, se aplicável.

Porém, este regime não é aplicável aos estabelecimentos que beneficiem, para o ano de 2021, de um regime de redução ou desconto na remuneração devida nos termos do contrato.

2.2. Apoios a micro, pequenas e médias empresas

Para além dos apoios a fundo perdido acima referidos, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 114/2020, de 30 de dezembro de 2020, aprovou um outro conjunto de apoios relativos a arrendamento não habitacional destinados às micro, pequenas e médias empresas:

  • um apoio de tesouraria, sob a forma de subsídio a fundo perdido para apoio imediato, a decorrer durante o primeiro semestre de 2021, destinado ao pagamento de rendas não habitacionais devidas por micro, pequenas e médias empresas que atuem nos setores particularmente afetados pelas medidas de mitigação da Covid-19, a determinar mediante despacho do membro do Governo responsável pela área da economia, no montante global de até €300.000.000;
  • uma linha de crédito destinada ao arrendamento não habitacional de micro, pequenas e médias empresas que atuem nos setores particularmente afetados pelas medidas de mitigação da Covid-19, com o objetivo de permitir o pagamento das rendas de 2020 que tenham sido diferidas para 2021, em condições a fixar por despacho do membro do Governo responsável pela área da economia, no montante global de até €100.000.000.
3. Cessação de contratos de arrendamento

Ficam suspensos até 30 de junho de 2021:

  • a produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;
  • a caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;
  • a produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio; e
  • a execução de hipoteca sobre imóvel que constitua habitação própria e permanente do executado.

    Estas suspensões de produção de efeitos não prejudicam o pagamento regular da renda devida nesse mês (as rendas de outubro a dezembro de 2020 e as rendas de janeiro a junho de 2021), a menos que os arrendatários tenham requerido o diferimento do respetivo pagamento.

O encerramento de instalações e estabelecimentos ao abrigo de norma ou medida administrativa aprovada no âmbito da pandemia provocada pela Covid-19 não pode ser invocado como fundamento para resolver, resolução, denunciar ou extinguir por outra forma de contratos de arrendamento não habitacional ou de outras formas contratuais de exploração de imóveis, nem para exigir a desocupação de imóveis em que os mesmos se encontrem instalado

Do mesmo modo, não poderá ser exigido aos arrendatários o pagamento de outras penalidades que tenham por base a mora no pagamento de rendas.

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